terça-feira, 26 de julho de 2011

Minhas férias, Pula uma linha, Parágrafo.

          “O primeiro dia de aula é o dia que eu mais gosto em segundo lugar. O que eu mais gosto em primeiro é o último, porque no dia seguinte chegam as férias.
Os dois são os melhores dias na escola porque a gente não tem aula. No primeiro dia não dá para ter aula porque o nosso corpo está na escola, mas a nossa cabeça ainda está nas férias. E no último, também não dá para ter aula porque o nosso corpo está na escola, mas a nossa cabeça já está nas férias.
Era o primeiro dia e era para ser a aula de português, mas não era porque todo mundo estava contando das férias. E como todo mundo queria contar mais do que ouvir, o barulho na classe estava mesmo ensurdecedor. O que explica o fato de ninguém ter escutado a professora gritando para a gente parar de gritar. Todo mundo estava bem surdo mesmo. Mas quando ela bateu com os livros em cima da mesa a nossa surdez passou e todo mundo olhou para ela.
Ela estava em pé, na frente do quadro e ficou em silêncio, com uma cara bem brava, olhando para a gente.
Quando um professor está em silêncio com uma cara bem brava olhando para você, é melhor também ficar em silêncio com uma cara de sem graça olhando para um ponto qualquer que não seja a cara brava do professor.
A professora puxou a cadeira dela e se sentou.
Atrás dela, no quadro-negro, eu vi decretado o fim das nossas férias e o fim do nosso primeiro dia de aula sem aula. Estava escrito:
Redação: Escrever 30 linhas sobre as férias.”

A divertida crítica de Christiane Gribel, em Minhas Férias, Pula uma linha, Parágrafo. (Moderna. 2005), trata da aflição do personagem Guilherme, garoto de 11 anos, que se vê desesperado diante da obrigação de ter de redigir sobre suas férias:
“Aqueles dois meses inteirinhos de despreocupações estavam prestes a virar 30 linhas de preocupações com acentos, vírgulas, parágrafos e ainda por cima com a letra legível depois de tanto tempo sem treino.”

A narração detalhada do sofrimento de Guilherme, da elaboração à correção da redação, traz à tona as dificuldades de produção de textos que os alunos apresentam e a aversão à escrita em que isso se transforma, servindo como um subsídio muito interessante para coordenadores pedagógicos no tocante à reflexão de professores quanto à metodologia em questão.

A trama mostra ainda a correção da redação que a professora faz, despertando a análise da prática tão disseminada de marcar em vermelho o texto do aluno, encerrando aí o processo avaliativo.
“As minhas férias, que tinham sido perfeitas para mim, não chegaram nem perto de terem sido boas para a professora. Elas voltaram cheias de defeitos. Faltou um esse no passe de craque do Paulinho, um acento na minha tática e a minha comemoração eu escrevi com tanta empolgação que acabou saindo com dois esses em vez de cê-cedilha.
E o pior do que eu imaginava foi o que ela fez com o meu golaço que estilhaçou em mil pedaços a janela do vizinho. Ela disse que “em mil pedaços” é um adjunto adverbial e que tinha que ficar entre vírgulas.
Eu olhei na Gramática e lá estava explicado que um adjunto adverbial é um termo acessório e a gente pode eliminar aquela parte da frase que ela continua a fazer sentido. Eu queria ver a professora dizendo para o meu vizinho que aqueles mil pedacinhos da janela dele eram só um adjunto adverbial.
E tem mais uma coisa: eu estava de férias. Era muito mais importante marcar o gol do que as vírgulas, concorda?
A professora não fez nenhum comentário sobre o que eu tinha escrito. Para ela tanto fazia se o meu gol tinha sido um golaço ou um frango do goleiro. Eu fiquei bem chateado. Ela tinha acabado com as minhas férias. Isso significava que era a terceira vez que minhas férias acabavam numa semana só. Não podia existir nada pior que isso na vida de um garoto de 11 anos.”

E quem de nós não é capaz de se identificar com a mensagem do texto?

Boa volta às aulas!

2 comentários:

  1. Angeli,

    Td bem? Sou membro do grupo Professores, Educadores e Formadores do Linkedin e passei por aqui para te parabenizar pelo lançamento do blog. Quando puder, visite também meu blog no endereço www.ogestor.eti.br

    Felicidades!

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  2. Olá, Angeli,
    Também gostei de sua iniciativa. Educação é um tema que precisa ser (re)pensado constante. Gostaria que visitasse o meu blog: http://renatocsar.blogspot.com
    Um forte abraço e muito sucesso.

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